Movimentos do campo apresentaram ao congresso nacional a reivindicação
para a liberação de fomento de 5 a 10 mil reais para famílias
agricultoras aumentarem e diversificarem a produção de alimentos de qualidade
durante e após a pandemia do novo coronavírus.
Impactados pelas medidas restritivas
adotadas desde a declaração de estado de calamidade pública no país, em março,
grupos produtivos de todos os estados brasileiros vêm sofrendo prejuízos, perda
de produtos e severas restrições de renda para prosseguir na atividade
agrícola.
“Essas famílias cumprem um papel
fundamental na produção de autoconsumo e no atendimento às feiras locais,
povoados e comunidades, contribuindo para que as pessoas não tenham que se
deslocar grandes distâncias para adquirir seu alimento”, explica Maria Kazé,
dirigente do Movimento de Pequenos Produtores (MPA).
A proposta, que deve ser analisada
nos próximos dias, é dirigida a grupos vulneráveis impactados pela pandemia,
incluindo assentados de reforma agrária, agricultores familiares, camponeses,
quilombolas, ribeirinhos, povos da floresta, pescadores artesanais, povos
indígenas, extrativistas e quebradeiras de coco. “O fomento vai estimular a
produção para o próprio consumo e a geração de excedentes para o consumo nos
circuitos curtos, beneficiando aproximadamente 2 milhões de famílias, que estão
vendo sua produção ser prejudicada com a pandemia”, diz a dirigente.
A proposta dos movimentos prevê um
acréscimo no valor do fomento para mulheres camponesas responsáveis pela gestão
da unidade de produção familiar, para que sejam aplicados diretamente na
produção de alimentos básicos e na manutenção familiar.
O recurso destinado à produção de
alimentos de qualidade faz parte de um pacote de medidas para socorrer os
agricultores familiares enquanto perdurar o estado de calamidade pública
causado pela pandemia. As propostas de fomento, crédito, aquisição de
alimentos, renegociação de dívidas e ações voltadas às mulheres agricultoras
foram construídas pelos movimentos sociais do campo e apresentadas ao deputado
Zé Silva (Solidariedade-MG), relator do projeto de lei (PL 886/2020), por
parlamentares do Partido dos Trabalhadores (PT).
“É necessário a adoção de medidas que
incorporem uma parcela maior da população, principalmente, as famílias mais
empobrecidas. É fundamental um Crédito Emergencial da Agricultura Familiar em
outros patamares e condições de pagamento que não seja o Pronaf. Deve existir,
por exemplo, política de fomento para as famílias agricultoras, recursos para
comercialização, justamente para que a produção não se perca nas propriedades,
e junto a isso uma política de a renegociação de dívidas dos agricultores”,
avalia Marcos Rochinski, coordenador geral da Contraf Brasil.
Abordando com prudência o risco
efetivo da escassez e da inflação de alimentos para a população brasileira nos
próximos meses, lideranças dos principais movimento ligados à agricultura
familiar já começam a apontar a gravidade do problema que pode surgir nos
próximos meses.
“A crise da pandemia e o desmonte das
políticas para agricultura familiar representam risco real de que a comida
fique mais cara nos próximos meses ou que comece a faltar alguns alimentos nas
cidades”, comenta Denis Monteiro, secretário executivo da Articulação Nacional
de Agroecologia (ANA).
“O preço da comida pode subir muito
mais, caso não haja políticas efetivas e rápidas de apoio à agricultura
familiar, que produz a maior parte dos alimentos que chegam na mesa do povo.
Pode custar muito caro não investir na agricultura familiar agora. Não é uma questão
para semana que vem, é pra ontem. Os deputados precisam compreender essa
urgência”, comenta Denis, mencionando que a inflação dos alimentos nos últimos
12 meses foi de cerca de 5%, significativamente acima do índice geral de
inflação no período, de 1,88%.
Relatos de perda e descarte de
produtos viraram uma rotina, desde meados de março, quando prefeituras e
estados suspenderam as aulas nas escolas e também a compra de produtos da
agricultura familiar que já estavam disponíveis para consumo. O Programa de
Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), que tinha a mais baixa
previsão orçamentária de todos os anos, desde sua criação em 2003, teve que
receber aporte de recursos adicionais, por demanda dos movimentos sociais,
alcançando 500 milhões de reais este ano.
Ao mesmo tempo, famílias urbanas que
perderam renda e ficaram em situação de vulnerabilidade devido à suspensão de
atividades nos demais setores da economia, viram a disponibilidade de alimentos
ser reduzida, além da falta que também passou a fazer a merenda que parou de
ser oferecida nas escolas públicas, para milhões de crianças em todo o país.
Fonte: CONTRAF-Brasil