Depois de um ano marcado por profundos retrocessos nos direitos sociais e trabalhistas no Brasil, 2018 começa com a promessa de ser decisivo para os rumos que o país tomará a partir das próximas eleições presidenciais.
A vitória improvável da direita, que ainda não tem representante e segue fragmentada, poderia hipoteticamente significar a consolidação do modelo neoliberal, entreguista, inaugurado pelo impopular e golpista, Michel Temer. Já os movimentos populares começam a se agitar frente aos desafios que já se apresentam.
No dia 24 de janeiro, a militância Sem Terra, assim como diversas outras entidades e organizações sociais, ocuparão a cidade de Porto Alegre para protestar contra a condenação do ex-presidente Lula, e pelo direito legítimo de que ele concorra às eleições presidenciais.
Sobre o balanço de 2017 e os desafios para 2018, Alexandre da Conceição, dirigente nacional do MST fala em entrevista. Leia:
Alexandre, você considera que 2017 foi uma extensão do ano de 2016 no que diz respeito à continuidade da pauta golpista de retiradas de direitos sociais?
O ano de 2017, sem dúvida, foi quando os golpistas conseguiram avançar ainda mais em seu projeto antipopular e neoliberal com a consolidação do fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário e com o sucateamento dos recursos públicos para a Reforma Agrária nas áreas de obtenção de terras. Foi o ano que o Brasil retrocedeu aos anos 80 quando constatamos o retorno da fome, a concentração de terras, cortes nas políticas públicas, como o Bolsa Família. Estamos hoje em um cenário de 7 milhões de brasileiros passando fome extrema, além do aumento da violência do latifúndio contras o povo e a natureza.
Quais medidas e leis aprovadas durante este ano impactam diretamente a vida no campo e as políticas públicas ambientais, agrárias, sociais e de desenvolvimento rural?
Tivemos um ano difícil também no Congresso Nacional, quando a bancada ruralista e golpista foi forte o suficiente para aprovar tudo que eles quiseram, como foi o caso da reforma trabalhista e trabalho escravo (com o trabalho intermitente). Essa reforma, por exemplo, terá impactos dramáticos para as trabalhadoras e trabalhadores rurais.
Outra medida de forte impacto foi a liberação ambiental para as mineradoras e como resultado dela, mais de 20 áreas ocupadas pelo MST no Pará sofreram despejos violentos neste fim de ano. Também temos um projeto de lei do Senado que muda estatuto do armamento, liberando para fazendeiros e gerando ainda mias mortes no campo, além claro, de muitas destas armas migrarem para as cidades.
Mas apesar da força dos golpistas, também demos um demonstração de forças nas ruas e conseguimos, mesmo que momentaneamente, barrar a Reforma da Previdência e o andamento da lei que libera terra para estrangeiros. Então este ano de 2018 já começa a esquentar muito cedo, com a bancada golpista buscando aprovar a Reforma da Previdência até o dia 19 de fevereiro e os movimentos estarão em alerta para impedir.
Também vale lembrar que a ‘PEC da morte’, a que congela os gastos públicos nas áreas sociais, será sentida ainda mais seus impactos em 2018, o que pode significar mais hospitais sem médicos ou medicamentos, escolas sem professor ou merenda escolar… o que nos levará a um atraso sem precedentes.
As privatizações se tornaram o carro-chefe das ações deste governo. Como o MST analisa esse processo e seus impactos para o campo brasileiro?
As privatizações, principalmente do nosso meio ambiente e do nosso território, têm impactos diretos ao trabalhador Sem Terra que, para conquistar a terra terá que derrotar esse governo nas ruas e nas urnas, além de ocupar os latifúndios. Se este governo continuar ou tiver continuidade por outros meios que não seja a eleição, então o Brasil será completamente vendido ao mercado internacional.
Também houve grandes retrocessos na pauta dos agrotóxicos, graças aos ruralistas. Como esse processo tem ocorrido e de que maneira os movimentos têm enfrentado esse cenário?
Os laboratórios de veneno, junto às transnacionais financiadoras desta bancada ruralista, fazem lobby todos os dias em Brasília para manterem as pautas de mais liberação de transgênicos e de mais utilização de veneno na agricultura, ou seja, o Brasil está indo na contramão do mundo, que vem a cada ano barrando e impedindo utilização de venenos e transgênicos na agricultura. Somo o país que mais consome veneno na agricultura, e por consequência, na nossa comida. Os parlamentares e o atual executivo têm como meta a entrega da agricultura brasileira para as grandes monopólios internacionais, portanto, eles trabalham para facilitar e gerir nossa agricultura.
No dia 13 de dezembro, o Orçamento Geral da União (OGU) de 2018 foi aprovado em sessão do Congresso Nacional. No geral, como os movimentos populares têm visto as ações de cortes do Governo Federal para os setores sociais no país?
Uma vergonha o orçamento aprovado, e que só vem a confirmar nossa linha política de que o golpe é cada vez maior para a classe trabalhadora e para os pobres deste país. O governo aprovou um orçamento para beneficiar os ricos e aumentar ainda mais a pobreza e a desigualdade no Brasil.
Programas como o de Aquisição de Alimentos (PAA), PNAE, Ates (Assistência Técnica aos Assentados), e os recursos do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) já não são suficientes. O quanto isso é prejudicial para a Reforma Agrária no Brasil, em especial para as famílias já assentadas?
Seguindo a avaliação dos cortes no orçamento, o PAA e Pnae são programas estruturantes do ponto de vista da produção e comercialização da agricultura familiar, que gera emprego e renda no campo e produz alimento de qualidade. Mas com o orçamento diminuindo mais de 40%, muitos agricultores perderão seus investimentos e a área de produção de alimento deve diminuir.
A Ates, que é um programa de assistência técnica, também teve orçamento reduzido em mais de 70%, retirando o direito do agricultor de ter um assistência técnica para melhor organizar sua produção de alimentos na agroecologia, sem falar de milhares de técnicos agrícolas que perderam o emprego com este corte orçamentário.
Na educação, o PRONERA, um programa criado para levar filhos de camponeses para a universidade, teve um corte de mais de 60%, o que vai reduzir drasticamente as vagas nas universidades para os trabalhadores rurais.
2017 foi um ano de muita mobilização e pressão social. Essa será a linha que o MST seguirá em 2018, considerando que é um ano de eleições?
2017 foi um ano de importes embates e, mesmo com a correlação de forças desfavorável, conseguimos impor algumas derrotas aos golpistas. Isso nos dá ainda mais força para seguir nas ruas com a tarefa de derrotar o golpe. Por isso, já iniciamos o ano convocando a todos para uma grande jornada em Porto Alegre, no dia do julgamento de Lula. Querem impedir que Lula dispute as eleições de 2018, consolidando assim o golpe, mas não vamos permitir.
Então não adianta que a prefeitura de Porto Alegre não autorize o protesto, não adianta o governador colocar toda sua força repressora nem mesmo que o judiciário tente impedir o povo de lutar. Vai ter luta sim em todo o Brasil no dia 24 de janeiro. Entendemos que uma eleição presidencial sem a participação de Lula é a continuidade do golpe, é fraude, e por isso o MST se manterá na linha de frente para defender a democracia e a participação de Lula nas eleições de 2018.
Além disso, vamos seguir com as lutas unitárias contra a reforma da Previdência, e claro, seguir com a luta pela Reforma Agrária e pelas desapropriações dos latifúndios que visem assentar as mais de 130 mil famílias que seguem acampadas em todo Brasil. Sem dúvidas, 2018 será um ano bastante quente na luta pela terra e contra as medidas golpistas.
*Editado por Leonardo Fernandes
Fonte: MST
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