|
Dom Jaime: “De modo nenhum estamos a favor da prática do aborto, que é um ato terrível para a vida da pessoa”. Foto: Wellington Rocha
|
O arcebispo metropolitano de Natal, Dom Jaime Vieira Rocha, afirmou esta manhã que, independentemente de quem seja o autor, a proposta que visa “ampliar a oferta de serviço de interrupção da gravidez”, mesmo nos casos permitidos em Lei, conforme propõe o candidato do PDT a prefeito de Natal, Carlos Eduardo Alves, caso eleito em outubro, “poderá facilitar” a procura por este tipo de procedimento, inclusive em casos em que a Igreja é contrária ao aborto, como na situação de estupro, por exemplo. Dom Jaime também se colocou contrário ao ensino anti-homofóbico nas escolas da rede de ensino fundamental de Natal.
“A posição da Igreja sobre o aborto está definida e clara. É importante que as pessoas tenham toda a condição, no caso a mulher, de ter o seu filho e não se sentir, por nenhum outro motivo ou manifestação de religião ou de concepção, como que obrigada a se livrar de uma gravidez por falta de condições para ter uma criança. De modo nenhum estamos a favor da prática do aborto, mas bom seria que as mulheres tivessem todas as condições de darem à luz, terem os seus filhos porque, normalmente, ninguém quer praticar o aborto, que é um ato terrível para a vida da pessoa, que ficará, para o resto da vida, com uma sequela do ponto de vista humano-psicológico”, dissertou Dom Jaime, em entrevista no início da tarde desta quarta-feira ao Jornal de Hoje.
Segundo o arcebispo, a sociedade brasileira, a partir de sua instância judicial mais elevada, o Supremo Tribunal Federal (STF), já tomou a posição sobre o tema, que é permitir o aborto apenas nos casos já previstos na legislação (estupro e risco de morte para a mulher). Entretanto, ele conclama a comunidade católica a preservar sua convicção, inclusive a favor da vida em caso de estupro. “Cabe a nós, quem for católico, preservar a sua convicção e a sua orientação, que a Igreja sempre deu e dará sobre este assunto. O estado é laico, mas a formação e a referência da nossa cultura, da nossa vivência religiosa ou sentimento religioso do povo, passa por essa condição de católicos, e devemos estar atentos a princípios a partir da palavra de Deus”, afirmou.
Segundo Dom Jaime, os católicos devem orientar, acima de tudo, o princípio que defende a vida humana. “Se há concepção e, por conseguinte, ali já está uma vida, que essa vida seja preservada. Eu não posso fazer o papel de juiz e dizer: ah, ela tem tanto tempo para fazer (o aborto), se não fizer, não pode fazer. Não. Nós advogamos que em todas as circunstâncias prevaleça a preservação do direito à vida. O que está em jogo é a vida humana, a vida humana deve ser respeitada, zelada e conservada em todos os seus momentos, desde a concepção até o seu termo natural.
Dom Jaime ressaltou que existem necessidades e direitos básicos fundamentais para a vida das pessoas, que devem ter mais evidência nos planos de governo, mais importantes do que aspectos como o da ampliação da oferta de serviços de interrupção da gravidez. “Eu advogo que a campanha e as propostas para Natal sejam levadas em conta a partir das necessidades de direitos básicos e fundamentais para a vida das pessoas, para sua dignidade, e para o seu bem-estar. Por isso que digo que certamente há tantos setores da vida humana que estão aí visivelmente prejudicados, sem merecer a devida atenção, que vejo que são muito mais importantes do que esses aspectos”, frisou.
Para Dom Jaime, é preciso “investir na qualidade de vida, na dignidade das pessoas, na condição para que tenham saúde”. Ele disse ainda ter “impressão de que tudo aquilo que vier para fortalecer o desrespeito à vida e à dignidade humana não está correto”.
CUIDADO
Dom Jaime enfatizou, durante sua entrevista, que está diante de uma campanha político partidária e que ele, na condição de arcebispo, deve zelar pelo papel de pastor da Igreja de Natal, sem qualquer preferência política por partido ou candidato. “A igreja tem se pautado na contribuição da educação política que viabilize aos eleitores a sua participação legítima na escolha de seus candidatos”, afirmou.
Entretanto, Dom Jaime ressaltou que os princípios fundamentais que norteiam a ética católica cristã permanecem. “Eles estão aí, na Sagrada Escritura, sobre o matrimônio, sobre a dignidade da pessoa humana, sobre o respeito incondicional à vida humana, desde a sua concepção até o seu término natural”.
Ele conclui a questão do aborto afirmando que não gostaria de se constituir juiz de programa de governo de nenhum candidato. “Quero dizer que a posição da Igreja é clara em determinados assuntos, e que estas questões devem passar em primeiro lugar pela responsabilidade da família, que é a primeira instância, mais nobre, mais santa e mais digna e, por conseguinte, mais responsável. Seria injusto e ingênuo achar que a sociedade está bem organizada, bem arrumada, a família muito bem constituída, podendo cumprir com todos os seus direitos e deveres quando não está. Por parte da orientação da Igreja, como católicos e como cristãos, nossa posição é em defesa incondicional da vida humana, desde a sua concepção, até o seu termo natural. E ainda mais dentro de um contexto político-eleitoral do Brasil, nós devemos estar atentos, para a condição, que nem sempre se leva em conta, de uma sociedade predominantemente cristã, católica, de formação cultural religiosa a partir destes princípios. Os católicos devem estar atentos àquilo que lhe diz respeito por convicção de princípios que devem ser assumidos e defendidos”.
Sexualidade
Em relação à inserção de conteúdo anti-homofóbico nas escolas de Natal, conforme propõe Carlos Eduardo, o arcebispo metropolitano de Natal afirmou que a homossexualidade é um assunto de alta complexidade, e que, embora reconheça ser algo que deva ser respeitado, quanto ao aspecto da dignidade humana, deve ser tratado pela família, e não, legitimado nas escolas.
“São assuntos bastante delicados, que, em primeiro lugar, caberia à própria família. E para a escola seria uma grande responsabilidade, que vai depender muito de quem vai estar passando, talvez, o conteúdo e a informação, de modo que seja isento, porque não vejo que seja objetivo e claro. Mas, se passa para esta mentalidade, este caminho ou esse discurso, de que isso aí está tudo bem, acho que não é assim”.
Dom Jaime afirma não saber se o Brasil tem nível de consciência social e de formação humana capaz de suportar a inserção deste conteúdo anti-homofóbico nas escolas. “Não vejo como sendo algo, não estaríamos talvez, no país, em termos de consciência social, formação humana no nível de se oficializar ou se levar para sala de aula um assunto que é tão complexo e merecedor de tanta atenção e de um trato com profundidade e com muita responsabilidade”.
Ele afirmou ter a impressão de que não se deve legitimar tal temática na grade curricular. “Tenho impressão que não devemos legitimar porque será que traz felicidade para as pessoas?”, questiona. Para ponderar ao final: “Mas também, por conseguinte, as pessoas que estão nessa situação, elas escolheram, são assim porque escolheram. É todo um assunto bastante complexo e grave que nós não podemos superficialmente tomar uma atitude. Não vejo como sendo aspectos a serem promovidos e encarados com responsabilidade (na escola)”, afirmou.
Robério: “Nós somos a favor da legalização do aborto”
Enquanto representantes católicos e evangélicos recriminam qualquer política pública que fortaleça a ideia de aborto, mesmo nas possibilidades legais, o candidato do PSOL a prefeito de Natal, Robério Paulino, apoia a proposta de candidatos como Carlos Eduardo Alves (PDT) e Fernando Mineiro (PT), que incluem em seus planos de governo políticas de ampliação da oferta do serviço de interrupção da gravidez nos casos permitidos por Lei.
“Acho essa proposta de Carlos Eduardo boa e insuficiente. Somos a favor de colocar uma lei que amplie os casos em que o aborto é permitido. Não só casos previstos atualmente na lei. Nós somos a favor da legalização do aborto no país”, afirmou Paulino esta manhã, em entrevista ao Jornal de Hoje.
“Porque hoje em dia o que acontece é que milhares de mulheres morrem em clínicas clandestinas e que não se enquadram nesses casos previstos em lei. E essa questão do aborto tem sido tratada como caso de polícia e nós achamos que a questão do aborto é uma questão de saúde pública”, acrescentou Paulino, que não acredita na existência de Deus.
“Nós respeitamos muito o credo e a religião das pessoas, mas, hoje, milhares de mulheres perdem a vida, a mãe e o feto, porque vão para clínicas clandestinas. O aborto tem que ser legalizado para que haja um tratamento humanizado, com qualidade e com rigor, na rede pública”, adicionou.
Paulino elogiou o plano de governo de Carlos Eduardo e Mineiro, por conter proposta de ampliação dos serviços de aborto legal prestados pela Prefeitura de Natal. “Nós somos a favor de um tratamento, principalmente em regiões mais pobres. Porque as mulheres ricas podem ter clínicas sofisticadas, enquanto as pobres sofrem nas mãos de verdadeiros carniceiros”.
O candidato do PSOL confirma a existência do tema no seu plano de governo. “A Secretaria de Saúde e a rede pública municipal de saúde devem atender os casos previstos na lei, mas também devem atender as mulheres que chegam em situação de pré-abortamento. O que acontece é que, como é ilegal, elas vão para clínicas clandestinas. Quando querem abortar, vão procurar clínicas clandestinas porque sabem que não há guarida legal na rede pública”, diz.
VIDA
E por que não incentivar a vida? Paulino responde que as mulheres que buscam o aborto não estão em situação sócio econômica para ter filhos. “Então, é um direito da mulher, se a rede pública não oferece planejamento familiar, às vezes ela está desempregada, não teve acesso ao planejamento familiar, não planejou e não se acha em condições”.
Segundo ele, “independente dessa discussão religiosa ou não, as mulheres vão continuar fazendo o aborto, você pode dizer para ela ter, mar ela prefere não ter. Independente dessa discussão, milhões de mulheres vão continuar fazendo o aborto. Isso precisa ser tratado como questão de saúde pública, porque independe da questão religiosa”.
Instado a falar sobre sua religião, Robério afirmou que é marxista e que advoga princípios de solidariedade “muito mais” que muitos religiosos. “Sou marxista, eu tenho minha ideologia. Se quiser me chamar de ateu, pode me chamar. Mas eu advogo princípios, de justiça, solidariedade, bondade, igualdade, muito mais do que muitos religiosos”, afirmou.
GAYS
Robério paulino se colocou ainda “totalmente a favor da introdução ensino anti-homofóbico no currículo das escolas de ensino fundamental, porque as pessoas têm direito de ter a opção sexual que quiserem e serem respeitadas em sua posição. Não é porque se ensina sobre índios nas escolas que todo mundo tem que ser índio. É pelo respeito de as pessoas terem qualquer opção”, afirmou.
A Parada Gay de São Paulo, segundo Robério, conta com a participação de muitas escolas. “Garoto de 12, 13 anos que está se descobrindo gay, ele convida seus amigos e isso leva a garotada de salas inteiras em São Paulo a Parada Gay. Não é questão de estimular o homossexualismo, mas de respeitar as pessoas. Respeitar o direito das pessoas fazerem da sua vida o que quiserem. Não é educação a favor do homossexualismo, mas a educação que leva a criança a respeitar o direito dos outros”, finalizou.
FONTE: Jornal de Hoje