Superlotação, celas insalubres, falta de ventilação e higiene, esgoto a céu aberto. Esses são alguns dos principais problemas encontrados no Complexo Penal João Chaves e no Presídio Provisório Raimundo Nonato, ambos na zona Norte de Natal, e que foram relacionados no relatório final do Mutirão Carcerário realizado em abril passado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A situação é tão crítica que o orgão recomendou a desativação da ala masculina do João Chaves.
Com uma superlotação de 79% acima da sua capacidade, a ala masculina do João Chaves é a que possui a pior estrutura física e as piores condições de sobrevivência para os 567 apenados que estão recolhidos em todo o complexo, que abriga ainda a ala feminina e o pavilhão para presos em regime semiaberto.
Vistoriada pelo juiz do CNJ Esmar Vencio Filho no dia 8 de abril passado, a unidade possui celas insalubres, com pouca iluminação natural, sem ventilação e intenso mau cheiro. O banho de sol também é comprometido, já que não há local apropriado para isso e também para a prática de atividades físicas, já que a edificação foi construída para abrigar presos do regime semiaberto e teve que ser adaptada para o cumprimento do regime fechado.
Diante das condições da unidade, que conforme o magistrado facilita a propagação de doenças infectocontagiosas devido à superlotação e à falta de higiene e de ventilação natural, o CNJ recomendou a desativação total ou a remodelagem da estrutura para uso somente do regime semiaberto. Ainda assim, serão necessárias novas adaptações.
E o fato do esgoto correr a céu aberto na parte externa da unidade, que passa por cima da calçada até chegar à rua, agrava ainda mais a situação, já que coloca em risco a vida da população que passa pela área. No relatório, Esmar afirma que “não há como manter a unidade funcionando da forma em que se encontra, sob pena de desvirtuar por total a finalidade do cumprimento das penas, além de representar graves ofensas aos direitos constitucionais e humanos dos presos”.
A parte destinada ao regime semiaberto também apresenta graves problemas com relação a higiene e alojamento dos detentos, que só vão para o local para dormir à noite, passando o dia inteiro fora. Durante a vistoria, foram encontrados restos de lixo e comida em toda a área, o que torna o ambiente insalubre diante da enorme quantidade de insetos como moscas e baratas na estrutura.
O magistrado afirmou ainda que só não há ratos no local por causa do grande número de gatos existentes na ala, que apesar de possuir capacidade para 250 apenados, abrigava na época 312 homens. A falta de manutenção também demonstra que a estrutura precisa passar urgentemente por reformas e adaptações, sob pena de ser necessária a intervenção e desativação da unidade.
Provisório abriga mais que o dobro da capacidade
Os mesmos problemas relatados no Complexo João Chaves também são citados pelo relatório final do CNJ como presentes no Presídio Provisório Raimundo Nonato, situado ao lado do primeiro. O agravante é que na unidade, a superlotação chega a ser de quase 130% acima da sua capacidade normal, já que ela abrigava, em abril passado, 400 presos quando só poderia comportar 174 homens.
Assim como seu vizinho, o presídio não fornece material de higiene, roupas, lençóis, colchões ou produto de limpeza aos presos, que são trazidos por parentes dos detidos. Outra reclamação constante é a qualidade da alimentação fornecida pela unidade, que, na ocasião, não apresentou cardápio ou plano nutricional próprio.
Entre as recomendações feitas pelo CNJ ao Governo do Estado, para melhorar a situação dos presos na unidade, estão a adaptação das condições das celas, em especial à circulação de ar natural e a transferência de presos para outras unidades, para que o problema da superlotação possa ser reduzido.
O Raimundo Nonato também é um dos presídios potiguares com o maior número de fugas registrados nos últimos anos. Entre os meses de janeiro de 2012 e de 2013, ocorreram dez evasões, com apenas quatro foragidos recapturados.
PEP despeja dejetos em rio Inaugurado há quase dez anos, o Presídio Estadual de Parnamirim (PEP) nunca passou por uma reforma e apresenta precárias condições de manutenção. Com uma população carcerária de quase 500 presos, quando sua capacidade máxima é de apenas 300 pessoas, a unidade despeja seu esgoto e rede de dejetos diretamente na nascente do Rio Pitimbu, que abastece parte das cidades de Natal e Parnamirim.
Construído no meio do mato e afastado dos centros das duas cidades, o PEP não possuía sistema de hidrantes aptos para combate a possíveis focos de incêndios e os poucos extintores existentes estavam todos vencidos no dia da vistoria, realizado em 25 de abril passado. Como determinação do CNJ, a unidade deveria construir uma estação de tratamento ou ligar o esgotamento sanitário na rede pública.
Unidades prisionais do interior também são criticadas por Conselho Nacional de Justiça
As péssimas condições de salubridade e estrutura das unidades prisionais da Região Metropolitana de Natal, constatado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) durante o Mutirão Carcerário, também são encontradas no interior do Estado. Entre as que apresentam pior situação estão o Complexo Penal Agrícola Mário Negócio e a Cadeia Pública, ambas em Mossoró; a Penitenciária Estadual do Seridó (PES), em Caicó e o Complexo Penal Regional de Pau dos Ferros.
As quatro unidades, inspecionadas pelo juiz Renato Magalhães, possuem estruturas físicas totalmente comprometidas, sem as mínimas condições de salubridade, higiene e segurança tanto para presos como para os servidores e visitantes e esgoto correndo a céu aberto, o que torna a vivência praticamente insuportável em todas.
Conforme o relatório final do Mutirão Carcerário, as instalações físicas do Complexo Mário Negócio estavam praticamente em ruínas, sem qualquer tipo de segurança para evitar possíveis fugas dos 429 detentos que estavam no local durante a vistoria, realizada no dia 4 de abril passado. A situação era tão crítica quanto a encontrada na última edição do mutirão, em 2010, com o agravante de a unidade ter sido interditada pelo juiz responsável pela Execução Penal no município.
No documento, o magistrado relatou que o prédio destinado aos presos do regime fechado não possui as mínimas condições para o encarceramento e que o ambiente é totalmente fétido, com esgotos correndo a céu aberto, lixo e dejetos espalhado pelos corredores e celas e celas superlotadas, presos amontoados sem observância dos mínimos direitos previstos na Lei de Execução Penal. “A situação dos internos no estabelecimento, como relatado anteriormente, é crítica e mesmo inconcebível”, escreveu.
Entre as recomendações e determinações do CNJ, estão a construção de novos pavilhões para abrigar os presos dos regimes fechado e semiaberto, além de um pavilhão para o presídio feminino, já que a área usada pelo complexo penal é ampla. A proposta, apresentada no relatório final do Mutirão Carcerário, é uma das ações previstas pelo Governo do Estado, que deve ampliar a unidade com a construção de uma área para comportar mais de 600 presos, com recursos próprios e do Governo Federal.
A situação na Cadeia Pública de Mossoró é semelhante à do Complexo Mário Negócio, com ambiente fétido, insalubre, sem higiene e instalações elétricas e hidráulicas necessitando de reparos urgentes, após anos sem uma manutenção preventiva e corretiva. Renato Magalhães afirmou no relatório que nada havia sido feito no local desde a última inspeção pelo CNJ, ocorrida em 2010 e que a situação é caótica na unidade.
Conforme o relatório, “a situação dos internos no estabelecimento é desumana. As celas superlotadas e insalubres. Não há assistência médica, odontológica, psicológica regular. Os presos reclamaram de forma enfática do tratamento a eles dispensado por alguns agentes penitenciários e pelos policiais militares do GTO. Em entrevistas reservadas, na ala da carceragem, narraram agressões físicas e abusos cometidos quando da visitação”.
Para amenizar a situação, o CNJ propôs uma reforma para ampliar o total de vagas e a criação de espaços próprios para a realização de visitas familiares e íntimas, assistência educacional, médica, psicológica, odontológica e social, além de práticas esportivas.
Presos com tuberculose em celas superlotadas na Penitenciária de Caicó
Cenário semelhante aos das unidades de Mossoró foi encontrado também na Penitenciária Estadual do Seridó (PES), situada no município de Caicó. Com uma população carcerária de 227 presos no dia da inspeção pelo CNJ, a estrutura apresenta sérios problemas relacionados ao abrigo dos apenados, que não possuem assistência médica e odontológica e vários detentos com doenças infectocontagiosas como tuberculose alojados em celas superlotadas, fétidas e mal-estruturadas, especialmente na ala do seguro, triagem e castigo.
Sem relatos de agressões e maus-tratos físicos, os apenados se mostraram indignados com as condições subumanas em que são obrigados a cumprir suas penas criminais e pediram, de forma insistente, transferência para outras alas da unidade. Entre as recomendações do CNJ, estão a ampliação de toda a unidade e a desativação imediata ou adequação física para que seja possível a ventilação e a iluminação natural.
Mau-cheiro e calor em Pau dos Ferros
“Penitenciária em estado extremamente precário. Não há a menor condição de higiene, segurança e limpeza. O esgoto ao céu aberto, fato já constatado na inspeção de 2010, permanece sem solução por parte do estado. As celas não possuem qualquer condição de segurança, pois as paredes danificadas não recebem qualquer espécie de reparo, salvo aqueles providenciados pela própria administração do estabelecimento”. Esse foi o quadro encontrado no Complexo Penal Regional de Pau dos Ferros, no Oeste potiguar.
Com 32,63% presos a mais que a sua capacidade total, que é de 95 homens, a unidade é uma das que apresentam as piores condições de sobrevivência para os presos do Rio Grande do Norte, em parte por ser situada na região mais quente do Estado. Conforme o relatório final do CNJ, a situação dos apenados é caótica e desumana, por causa do forte mau-cheiro de fezes e pelo calor, que somado a um sistema de ventilação precário, torna o local totalmente insalubre.
Para piorar, os detentos afirmaram ainda que são vítimas de agressões quando há intervenções na penitenciária, principalmente por parte do Grupamento Tático Operacional da Polícia Militar. Durante a inspeção, foi constatada no corredor e no interior de uma cela várias marcas nas paredes, que, conforme o relatório, teriam sido produzidas durante intervenção do GTO mediante o uso de balas de borracha e outras, segundo relato dos presos, por projéteis disparados por fuzil.
FONTE: Jornal de Hoje